A Barril chega ao Vila: outras experiências
Por Daniel Guerra
Entre a Revista Barril e o Vila Velha há uma diferença clara de idade.
Nós mal comemoramos o segundo ano e o Vila já avança no seu cinquentenário. Mas
entre o balbuciar de revista jovem e a vasta experiência desse teatro fincado
no centro da cidade, terminamos encontrando - de maneira um tanto misteriosa -
uma linguagem bastante própria, de modo que se podemos apenas esboçar as
primeiras marcações nesse terreno relacional, é ao porvir da experiência que
pertencem os frutos inesperados.
Na vida, é sempre difícil identificar as causas dos encontros. Entre nós
não seria diferente. Sabemos que o Vila já passou por várias temporadas: mudanças
de atores, de diretores, entradas e saídas de grupos, pendengas financeiras e
ascensões meteóricas, e se a Barril chega nesse barco justo agora, no final de
uma década ameaçada por diversas intempéries e turbulências é porque deve
existir aí – ou assim preferimos acreditar – qualquer coisa de muito pujante.
Mas, assim como a juventude nunca é necessariamente a promessa do novo
– como o quer a turba dos
publicitários – está longe de nós querer trazer ao Vila qualquer novidade. Até porque
é o Vila mesmo, como prova a sua história, que possui o novo como força motriz
para a ação. Basta lembrar o nome do seu grupo fundador, a Sociedade do Teatro
dos Novos, que aliás ressurge hoje com novos integrantes, como a marcar a um só
tempo uma mudança de rumos necessária e um retorno alegre do que já morreu, como acontece em muitos rituais.
A criação da universidade LIVRE do Vila foi um passo importante para a cidade, e em
termos nacionais, acena para novas possibilidades de ensino e produção - basta
que os olhos e ouvidos se atentem. Num país em que o conhecimento, a teoria e o
pensamento sobre arte insistem em permanecer confinados dentro dos muros acadêmicos, fundar um espaço onde a criação
de espetáculos esteja intimamente relacionada ao labor intelectual e à produção
de condições materiais significa trazer ar fresco a um lugar abafado.
Quando fundamos a revista não tínhamos ideia da proporção que ela
tomaria. Imediatamente tivemos os melhores retornos. As pessoas vinham até nós
com os olhos e os dedos cheios de desejo, dizendo que finalmente vislumbravam
um espaço para a crítica na cidade. É sabido que os jornais impressos não dão conta do recado, e os blogs
pessoais ou coletivos subsistiam por muito pouco tempo, e mesmo assim, sem a
disciplina editorial que nos impusemos a nós mesmos. Mas intuímos que, mais do
que isso - e o mais importante -, estamos colaborando, pouco a pouco, a estimular por estas
bandas uma atmosfera intelectual.
É óbvio que para a sustentação dessa atmosfera não basta que surjam
uma ou duas iniciativas isoladas. É preciso que brotem pontos de inteligência
aqui e ali; que as pessoas se ponham cada vez mais a escrever e a não ter
vergonha de mostrar seus pensamentos; é preciso que novos coletivos se
organizem, e que o conhecimento gerado por um e por outro atravesse todos os
lados. Um campo de arte fértil, em qualquer lugar do mundo, é aquele que abriga
em si, concomitantemente às obras, uma fervilhante produção intelectual.
Por isso, já na chegada, nós e o Vila propusemos uma oficina chamada Escritas
da Cena, que será ministrado por três editores da Revista Barril:
Amine Barbuda, Daniel
Guerra e Igor de Albuquerque. As inscrições serão
abertas a qualquer um que mostre interesse pela escrita e pela cena. Ao mesmo
tempo o ESCRITAS DA CENA se constitui como o embrião de um novo laboratório dentro da própria
Universidade Livre, cujos participantes estão convidados a atuar.
Paralelamente, inauguramos aqui, neste espaço
virtual, a Vila Barril. Este é o selo que marca a união das duas
iniciativas. Os textos produzidos tanto pelos participantes dos laboratórios quanto
pelos integrantes da universidade LIVRE e do Teatro dos Novos serão publicados periodicamente nessa
plataforma. Serão resenhas e críticas de peças de teatro, exposições, shows,
filmes e espetáculos de dança, indicações de obras, etc. Inaugura-se assim, com
esse pequeno passo, um espaço para o livre pensamento nas artes, justo num
teatro que não apenas resiste mas continua propondo novas possibilidades para o
mundo.
Comentários
Postar um comentário